Este livro envelhecido Tem marcas que eu mesmo fiz E a própria vida hoje quis Dar conta do que guardei... Nos rastros que já cruzei E o tanto que hei de andar, Percebi que ao versejar Confesso tudo que sei. O abraço quando guarida Mostra no gesto a clareza Razão inversa à vileza De quem esconde consigo Armadilhas neste abrigo Expondo em falsa proposta Que a mão que afaga as costas Jamais oferta perigo. O espinho carrega a culpa De ferir a quem afaga - Casca seca e vida amarga - Seu destino não foi pleno... Teve a bênção do sereno Na vivência que lhe cabe, E apenas ele que sabe Que a flor também tem veneno. A solidão é poesia Escrita em verso calado... Logo ao tê-la no costado Se deixa de ser sozinho, E assim, revela aos pouquinhos - Paciência não é cansaço - Pois bem pouco adianta o passo Se for maior que o caminho. A confiança, se perdida Talvez não ache retorno... Na ferida do abandono Descobre quem lhe merece, Ao seu jeito, reconhece Que diante à palavra errada Bem mais vale dizer nada Num silêncio – quase prece. O perdão é cura entregue A quem se aceita aprendiz Do ensino que a cicatriz Demonstra em paciência e dor, Pois a fé só tem valor Na reza de quem bem sabe Que pouco adianta o milagre Se o santo for pecador. O sonho, embora buscado, Nasce e morre junto a nós Será inverdade no após Se não lhe cuida o presente, E teima em contar à gente Sobre distância e saudade Se acaso a felicidade Toma um rumo diferente. O tempo leva consigo Nas rugas simples da idade A real capacidade De que ele mesmo conserve Aquilo que a história escreve E se transforma em lição, Pra o livro do coração Guardar somente o que deve. O olhar, guardião da face, Conforme este livro ensina Carrega a eterna sina De ser sinal da verdade, E deflagra, sem piedade, Alguém que com dita ira Pensa que a voz da mentira Calará a sinceridade. Todo livro, embora antigo, Traz consigo uma lição Este, do meu coração, Também não é diferente, Em suas linhas, sabe e sente Tudo que mais nos indaga E entende as dores amargas Que por vez invadem a gente. Suas páginas são um segredo Por nunca encontrarem fim Contam do não e do sim Do final e do começo, Eu que tanto lhe conheço Guardo na estante da alma... Não o decifro sem calma, Tão pouco o leio ao avesso. Desta forma, folha a folha, Descubro aquilo que sou... E se o tempo me guiou Me confesso por inteiro Neste livro companheiro Das horas que, sem aviso, A saudade que escravizo Faz de mim um prisioneiro.