Quem, eu? Eu! Sou filho daqui mesmo, devoto de Santa Bárbara, neto do velho “Mandico,” feitor da turma da linha, que fez a estrada do trem... Meu nome? Me chamam Pedro Garoa, afilhado do seu Hugo, chefe da estação daqui. Mas com esse nome aí, não me “alembro” de ninguém. Conheço toda esta gente, que vive à beira dos trilhos, sonhando co’as boas novas, que hão de florir a consciência dos viajantes deste trem. Esse mundo das estradas, conheço de ponta a ponta: de Porto Alegre a São Borja, da Vacaria ao Chui. Mas com esse nome aí, não me “alembro” de ninguém!!! Onde moro? Morar mesmo, não moro, vivo “anssim” meio acampado, ali na beira do mato; esperando que o governo, pague de vez o meu soldo; vou juntar tudo que tenho, vender o qu’está sobrando depois, vou ver meu padrinho, que há pouco foi transferido pra gare de São Leopoldo... Dizem que a vida por lá, anda “de braço” co’a gente, o dinheiro corre solto, serviço tem “a la farta” e mulher é como pedra nos campos de Cacimbinha. Espero que o meu padrinho, depois de me pôr a bênção, me convide pra ficar, nem que seja pra cevar algum mate chimarrão. Não vê, que sou “jubilado”, além do dinheiro curto, recebo sempre atrasado; a “plata” mal dá pras contas, “inda” bem que estou solito. A Porcina foi embora, co’a desculpa dum chamado, que a mãe andava adoentada. Quando o dinheiro escasseia, não existe homem bonito, pra mulher interesseira. As mulheres não entendem, que um homem, depois de andar de rédea solta nas ruas, não se prende a choramingo. Pra mim, a vida é uma festa, de “luna,” gaita e aromas, banho de sanga e bailanta e resto, tudo é domingo. A minha idade? Eu nasci no mês das geadas, no ano da seca grande; os mais antigos diziam : que o trigo morreu de sede e o sol matou azevém. Que mal pergunte, e o senhor, que tanto nos especula, por certo não se encabula, co’essa prosa de guri; o que fazes por aqui, se não conheces ninguém? Sabes com quem estas falando? Eu sou ... Me desculpe, delegado, se faltei co’a educação; não sabia que o senhor, vinha a ser aparentando do tal Amâncio Aragão. O Senhor! Não me lembro do senhor, não faz muito que voltei; andei batendo matraca, por este mundo de Deus. “bueno” foi um prazer, desejo sorte pros seus “com permiso” e até mais ver.. “Teje” preso, seu covarde, aonde pensa que vais? Me desculpe, mas não penso, nem transfiro pra depois o que tenho que fazer. Não queria lhe dizer, agora digo e repito: ninguém me leva no grito nem me embrulha na conversa. Sou inimigo de pressa, por isto ando solito... Saiu pra fora, o Garoa, e o delegado saiu. Depois que o dia sumiu, no braseiro do poente, o silêncio dos valentes celebrava na canhada: lampejos das arrancadas, de ferro-branco, estouro e o Garoa, por mais touro numa cruz beira d’estrada, deixou a história gravada no cabo dum marca touro.